Neste artigo para o Jornal O SERRANO, Henrique Vieira Filho nos conta sobre o Dia Dos Avós (26 de julho) e as mais encantadoras histórias indígenas dos avós que criaram o universo.
Publicado resumido no Jornal O SERRANO, Nº 6365, de 28/07/2023
Somente este ano, convivendo um pouco mais com netos, é que admiti que já tenho o título de “vovô”, passando a exercer o papel de deseducar as crianças.
Foi o Papa Paulo VI quem determinou 26 de julho como sendo o Dia Dos Avôs, em homenagem a Santa Ana e São Joaquim, canonizados por serem os “vovôs” de Jesus.
A mitologia da maioria dos povos atribui paternidade e maternidade à criação do mundo. Curiosamente, nas tradições de vários povos originários do território brasileiro, o Universo não teve pais, e sim… avós!
Uma das mais bonitas histórias é a de Nhanderuvuçu, o “Avô De Tudo”, que surgiu de um suspiro, virou pensamento e deu forma a si mesmo.
Cada batida de seu coração relampejava luz sobre as trevas primordiais, dando origem ao mundo que, até hoje, oscila entre a criatividade e a destruição, tal qual a versão chinesa do Yin e Yang. Entediado, criou também os demais deuses e o Kayuá, o verbo, o dom da palavra, para termos acesso ao conhecimento.
Na versão do povo Tukano Hausirõ Porã, o “Avô do Universo” se chama Umuku Ñehku, que sempre existiu e ao ver o vazio do cosmo, passou a criar a tudo, usando seu cajado e orações.
Por sua vez, na tradição oral dos Kêhíripõrã (“Filhos do Sonho”), da cultura amazônica dos Desana, foi a Yebá Buró, a “Tataravó do Mundo”, a “Não Criada”, quem apareceu em um aposento feito de quartzo branco e se pòs a imaginar como deveria ser o mundo e seus habitantes. Seus pensamentos criaram um infinito balão que se inflou sugando todas as trevas, dando origem à “Maloca Universal”. Dos trovões, ela criou os “Avós do Mundo”, aos quais ordenou fazerem a luz, os rios e a humanidade. Como eles não souberam fazer direito, surgiu Yebá Göãmã, o “Bisneto do Mundo” e, com seu bastão sagrado, cumpriu a empreitada.
Também nas religiões de matriz africana encontramos os chamados Pretos Velhos, Nanã e Obaluaê, entidades que personificam o conhecimento e poder ancestrais.
Na Psicanálise, estudamos padrões de histórias que são semelhantes em todas as culturas, independente de época ou região: são os chamados “arquétipos”. Um deles é o do “Ancião”, que representa a sabedoria adquirida pela experiência.
Ainda sou novato neste cargo, mas, confesso um dia querer o título de “vovô sabe-tudo”! Pelo menos, aos olhos dos netos!