Café espresso decorado com logotipo da cidade de Serra Negra
Publicado resumido no Jornal O Serrano, Nº 6300, de 15/04/2022 e na íntegra em https://artivismo.com.br/2022/04/19/todo-dia-era-dia-de-indio
DOI: https://doi.org/10.5281/zenodo.6470571
Nestes dias, o café voltou à pauta como candidato ao protagonismo turístico de Serra Negra.
Ele mais do que merece. De fato, sem o café, não teria como escrever este artigo. Nem Honoré de Balzac teria completado os mais de 80 volumes da Comédia Humana: fazia questão de comprar pessoalmente sua mistura preferida de grãos
Henrique Vieira Filho, seu artigo sobre Café no Jornal O Serrano e sua obra “Surreal Coffee” (óleo e acrílico sobre tela)
Não eram nas universidades, e sim, nas cafeterias que grandes cientistas debatiam suas teses e escreviam seus livros: Edmond Halley (o astrônomo que nomeia o cometa), Isaac Newton, Adam Smith (“A Riqueza Das Nações”), Voltaire, Rousseau, Montesquieu, entre uma xícara e outra, colaboraram com Diderot para concluir a “Encyclopédie” (integralmente compilada no “Café de la Régence”), a síntese definitiva do pensamento iluminista.
Johann Sebastian Bach compôs a opereta cômica, a “Cantata do Café”, contando a história de um pai que tenta fazer com que sua filha não tome café, oferecendo um noivo em troca. Espertamente, ela inclui uma cláusula no contrato matrimonial que a permite tomar café sempre que quiser.
A Revolução Francesa foi deflagrada no “Café de Foy”, onde uma multidão reunida presenciou Camille Desmoulins, que pulou em uma mesa brandindo uma pistola e gritando: “Às armas, cidadãos! Às armas!”.
Conforme escreveu o historiador francês Jules Michelet “aqueles que se reuniram dia após dia no café viram com olhar penetrante, nas profundezas de sua bebida negra, a iluminação do ano da revolução”.
Os cafés públicos também funcionaram como mercados de ações, a tal ponto de, literalmente, uma cafeteria em Londres adotar o nome de Bolsa de Valores.
A Cafeteria Lloyd’s era o ponto de encontro de donos de navios e agentes que faziam seguro de suas embarcações, nascendo, assim, a “Lloyd’s of London”, a maior seguradora do mundo.
As cafeterias eram centros de autodidatismo, literatura, filosofia, inovação comercial, agitação política e fonte de notícias. Ou seja, foi a Internet dos iluministas!
“Café, a bebida sóbria, o poderoso alimento do cérebro, que, ao contrário de outros destilados, eleva a pureza e a lucidez; o café, que remove da imaginação as nuvens e seu peso sombrio e que ilumina a realidade das coisas de repente com o brilho da verdade”. Jules Michelet, historiador francês (1798-1874)
Narrador
Silêncio, não faleis, e ouçam o que acontece:
Aí vem o senhor Schlendrian, com sua filha Liesgen, e ele rosna como um urso, ouçam o que ela lhe fez!
Aria (baixo)
Schlendrian:
Não são suficientes os cem mil problemas que se tem com os filhos!
O que todos os dias, à minha filha Liegen, digo é totalmente inútil.
Recitativo (baixo e soprano)
Schlendrian:
Filha má e rebelde,
Ah! Quando alcançarei meu propósito, deixa o café!
Liesgen:
Pai, não sejais tão severo!
Se não posso tomar por dia, três xícaras de café, ficarei, para meu mal, mais fraca que uma cabra.
Aria (soprano)
Liesgen:
Mmm! Como é saboroso o café, mais delicioso que mil beijos, mais doce que o vinho moscatel.
Café, café eu preciso e quem quiser agradar-me, ah! que me sirva um café!
Recitativo (baixo e soprano)
Schlendrian:
Se não deixas o café, não irá mais a nenhuma festa, nem tampouco passear.
Liesgen:
Ah, tudo bem!
Mas, deixa-me o café!
Schlendrian:
Ah, pequena atrevida!
Não lhe darei saias com aros, como é a moda.
Liesgen:
Me conformo tranquilamente.
Schlendrian:
Nem ficarás na janela, e não verás ninguém que lá fora passa!
Liesgen:
Tudo bem, mas por favor, deixa-me o café!
Schlendrian:
Nem tampouco te darei uma argola de ouro ou prata para prender o lenço em tua cabeça!
Liesgen:
Bem, bem, mas deixa-me o meu gosto!
Schlendrian:
Liesgen caprichosa, então cederá em tudo?
Aria (baixo)
Schlendrian:
As moças teimosas não são fáceis de convencer.
Mas, se se encontra uma maneira, ah! se pode conseguir!
Recitativo (baixo e soprano)
Schlendrian:
Farás o que teu pai diz!
Liesgen:
Tudo, menos sobre o café.
Schlendrian:
Bem, então terás de resignar-te em nunca ter jamais um marido.
Liesgen:
Ah, pai, um marido?
Schlendrian:
Juro que não o terás.
Liesgen:
Até que eu não deixe o café?
Então o deixarei para sempre!
Ouça, pai, não tomarei mais.
Schlendrian:
Então sim, terás um marido.
Aria (soprano)
Liesgen:
Hoje mesmo, querido pai, o dê-me!
Ah, um marido!
Isto sim que me convêm!
Ah, se em breve em lugar do café antes de ir deitar-me, tivesse um galante enamorado!
Recitativo (tenor)
Narrador:
Agora o velho Schlendrian vai buscar da maneira que para sua filha rapidamente possa encontrar uma esposo.
Mas Liesgen em segredo disse:
Nenhum noivo entrará nesta casa, se antes não me promete, no contrato matrimonial escrito, que me será permitido preparar café quando desejar.
Coro (terceto: soprano, tenor e baixo)
Todos:
O gato não deixa os ratos e às jovens agrada o café.
A mãe ama o café, a avó também o toma, quem culpará a filha?